GUIU EM PEDAÇOS

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6 de jun. de 2010

TENDÊNCIAS/DEBATES: A luta antimanicomial e a psiquiatria

 Nenhum sistema de saúde mental pode funcionar sem que haja a disponibilidade de leitos suficientes para acolher o paciente em crise
 
18 de maio  É O DIA reservado para comemorar a luta antimanicomial. Dia de levantar a questão: quais os princípios que devem nortear as políticas de saúde mental?
Os serviços de assistência à saúde mental em países em desenvolvimento não estão conseguindo atender às necessidades de tratamento dos pacientes, face à alta morbidade psiquiátrica na população.
Um princípio fundamental da disseminação da assistência mental à comunidade é a noção da igualdade de acesso das pessoas aos serviços em seu bairro ou região de moradia.
Outro princípio fundamental é a garantia dos direitos de autodeterminação e autonomia dos indivíduos com transtornos mentais como cidadãos. Esses princípios foram ratificados pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotados em 1991.
São textos que estabelecem três pontos importantes, em se tratando da pessoa com transtorno mental: o direito de ser tratada sem discriminação; o direito à presunção de capacidade legal, a menos que a incapacitação fique claramente demonstrada; e a necessidade de envolvimento dos usuários dos serviços e seus familiares no desenvolvimento de políticas que afetam diretamente suas vidas.
As mudanças nas políticas de saúde mental podem ser divididas em três fases:
o estabelecimento dos asilos psiquiátricos, a partir de 1880 até 1955; o declínio do sistema de institucionalização e isolamento, pós-Segunda Guerra; e a reforma dos serviços de saúde mental de acordo com abordagem baseada em evidências, no equilíbrio e na integração de serviços comunitários e hospitalares.
A integração entre comunidade e serviços hospitalares é reconhecida como um "modelo de assistência equilibrado", no qual a maioria dos serviços funciona na comunidade, em centros próximos à população atendida, onde a internação hospitalar é reduzida e, geralmente, efetivada nas enfermarias psiquiátricas dos hospitais gerais.
Os países em desenvolvimento devem estruturar cinco categorias de recursos para organizar o desenvolvimento dos serviços: clínicas ambulatoriais para atendimento de pacientes; equipes de saúde mental comunitária; serviços de atendimento ao paciente em crise; assistência domiciliar baseada na comunidade; e serviços de encaminhamento para emprego, ocupação e reabilitação. A assistência orientada para a comunidade deve preencher, ainda, os seguintes requisitos: atender às necessidades de saúde pública, com prioridade para o tratamento dos doentes mais graves; desenvolver centros locais e acessíveis; mobilizar a participação dos usuários e seus familiares nas políticas de planejamento; e provisionamento dos serviços de saúde mental.
A Associação Mundial de Psiquiatria nomeou uma força-tarefa para produzir diretrizes sobre as etapas, os obstáculos e os erros a serem evitados na implementação de um sistema de saúde mental comunitário.
O conteúdo desse editorial estará no próximo número da "Revista Brasileira de Psiquiatria" e o relatório completo será divulgado na edição de junho do "World Psychiatry". O relatório levantou vários erros-chave. Primeiramente, não há planejamento de saúde mental sem a participação de psiquiatras e usuários. Em segundo lugar, o planejamento deve ser acompanhado por sucessão racional de eventos, de modo a evitar o fechamento de um hospital psiquiátrico antes que o serviço comunitário de assistência esteja solidamente estabelecido na mesma área.
Nenhum sistema de saúde mental pode funcionar sem a disponibilidade de leitos suficientes para acolher o paciente em crise. Outro erro comum é associar a reforma a um interesse ou grupo político particular, o que pode fazer com que qualquer mudança de governo comprometa as ações tomadas por predecessores.
Concluindo, os princípios fundamentais de orientação das políticas de saúde mental nos países em desenvolvimento preveem que estas devem se basear nas necessidades de saúde pública, levar em consideração a proteção dos direitos humanos e serem projetadas levando em conta sistemas de saúde mental baseados em evidência e custo-efetividade.
É o momento, portanto, de se buscar um consenso para a defesa da melhoria de serviços de saúde mental de qualidade, capazes de atender milhões de pessoas sem recursos e completamente desassistidas, nos países em desenvolvimento.
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*JAIR MARI* é professor do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo).
*GRAHAM THORNICROFT* é professor do Instituto de Psiquiatria do King's College, em Londres.

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